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no brasil,a aquisição dos direitos ocorreu da mesma forma que na inglaterra?

Sagot :

É preciso discutir o que de fato é cidadania e o que representam os direitos civis, políticos e sociais. A definição utilizada nesse artigo será a teoria do clássico autor britânico T.H. Marshall, apresentada em sua obra “Cidadania, classe social e status”. Para o autor, cidadania corresponde à conquista de três direitos: o civil, o político e o social. O direito civil diz respeito basicamente à liberdade individual: liberdade de ir e vir, de pensamento, de fé, de imprensa, de fechar contratos legais, igualdade perante a lei e direito à justiça, direito ao próprio corpo e direito à propriedade privada. Deve-se entender o direito político como a possibilidade de participar do exercício do poder político, candidatar-se, votar e ser votado, criar e filiar-se a partidos políticos, participar de movimentos sociais, entre outros. Por último, os direitos sociais dizem respeito ao atendimento das necessidades básicas de um ser humano que garanta o mínimo de bem-estar, e que ele leve a vida de um ser civilizado. Por exemplo, direito à alimentação, à moradia, à educação, à saúde, a um salário digno.

Estes três direitos não surgiram do nada, bem como não foram predeterminados por alguém. Existe uma cronologia racional para o surgimento deles. Há toda uma mudança do cenário social de uma época que é primordial para o surgimento da cidadania. Marshall então analisa como ocorreu o desenvolvimento e aprimoramento da cidadania no estudo do caso da Inglaterra, e apresenta uma sequência lógica para essa evolução.

Verifica-se que houve, primeiramente, uma separação das instituições que asseguravam os direitos civis, sociais e políticos. Nos velhos tempos, os direitos eram confundidos justamente pela ligação entre as organizações, já que elas desempenhavam várias funções. Uma única casa do Estado assumia papel de assembleia legislativa, conselhos governamentais, entre outros. Quando houve o desligamento das instituições que cuidavam dos direitos fundamentais à cidadania, foi possível que cada direito se desenvolvesse seguindo seu próprio curso e, na medida em que fosse necessária, cada um em seu próprio tempo. Por exemplo, surge o Parlamento para os legisladores, os Tribunais de Justiça para juízes e advogados, e as diversas instituições que asseguram os direitos sociais para toda a sociedade.  

Feita essa separação institucional, é possível até identificar em qual período os direitos começaram a moldar sua forma de fato. Observa-se o caso da Inglaterra. No século XVIII, surgiram os direitos civis primeiramente. Lá, no século XVII, todos os homens já eram livres. Talvez seja um pouco lógico o porquê disso, mas o direito que assegura a liberdade ao cidadão e adiciona algumas características à sua vida civil, como a liberdade de imprensa e a liberdade de escolha comercial vai ser o primeiro a surgir.

Uma vez que o homem participa da vida econômica de sua cidade ou Estado, ele irá querer gozar também de direitos políticos e participar da esfera pública. No século XIX, era necessário enriquecer o status de cidadão com novos direitos e deveres e organizar a vida civil. Surge, então, o direito político, que permitia que o trabalhador se organizasse em sindicatos, partidos políticos e fosse eleito. A priori, os direitos políticos eram restritos a grupos fechados da elite, mas ao longo do tempo esse monopólio foi quebrado e a participação de todos na vida pública foi possível com o sufrágio universal em 1918. O direito ao voto deixa de limitar a atividade política às classes economicamente desenvolvidas e passa a ser para todos. Mais uma conquista dos cidadãos.

Os direitos sociais surgem por volta do século XX. Houve a necessidade da criação na Inglaterra de um “salário mínimo” (Poor Law em 1834) para assegurar o sustento básico das famílias inglesas. Logo esse sistema entra em colapso, mas o autor coloca em destaque a necessidade do respaldo social que a população deve ter em meio às transformações do cenário familiar, e principalmente do trabalho industrial, pouco regulado e que muitas vezes feria a dignidade do cidadão, homem ou mulher, jovem ou adulto. No âmbito social, ganha destaque a questão da educação. Ela interfere diretamente no cumprimento dos demais direitos, mesmo sendo o social o último a surgir. Quando é garantido pelo Estado que todas as crianças terão educação, tem-se noção do papel da cidadania e de que estão sendo moldados adultos em potencial que futuramente participarão da vida na sociedade. A educação é necessária para assegurar a liberdade civil, da mesma maneira que e a democracia política necessita de um eleitorado educado. A educação é tida como condição de existência para a discussão dos demais direitos.