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Leia o trecho a seguir de uma crônica de Antônio Prata:

Um escritor! Um escritor!


Com o jornal numa mão e um guaraná diet na outra, eu caminhava pelas ruas de Kiev, desviando de barricadas e coquetéis molotov, quando a voz no sistema de som me trouxe de volta à poltrona 11C: "Atenção, senhores passageiros, caso haja um médico a bordo, favor se apresentar a um de nossos comissários". Foi aquele discreto alvoroço: todos cochichando, olhando em volta, procurando o doente e torcendo por um doutor, até que, do fundo da aeronave, despontou o nosso herói. Vinha com passos firmes "grisalho, como convém", a vaidade disfarçada num leve enfado, como um Clark Kent que, naquele momento, estivesse menos interessado em demonstrar os superpoderes do que em comer seus amendoins.

Um comissário o encontrou no meio do corredor e o levou apressado até uma senhora gorducha que segurava a cabeça e hiperventilava na primeira fileira do avião. O médico se agachou, tomou o pulso, auscultou peito e costas, conversou baixinho com ela, depois falou com a aeromoça. Trouxeram uma caixa de metal, ele deu um comprimido à mulher e, nem dez minutos mais tarde, voltou pros seus amendoins, sob os olhares admirados de todos. Ou quase: a minha admiração, devo admitir, foi rapidamente fagocitada pela inveja. Ora, quando a medicina nasceu, com Hipócrates, a história de Gilgamesh já circulava pelo mundo havia mais de dois milênios: desde tempos imemoriais, enquanto o corpo seguia ao deus-dará, a alma era tratada por mitos, versos, fábulas, e, no entanto...


No entanto, caros leitores, quem aí já ouviu uma aeromoça pedir, ansiosa: "Atenção, senhores passageiros, caso haja um escritor a bordo, favor se apresentar a um de nossos comissários"? Eu não me abalaria. Fecharia o jornal sem afobação, poria uma Bic e um guardanapo no bolso, iria até a senhora gorducha e me agacharia ao seu lado. Conversaríamos baixinho. Ela me confessaria, quem sabe, estar prestes a reencontrar o filho, depois e dez anos brigados: queria falar alguma coisa bonita pra ele, mas não era boa com as palavras. Eu faria uma rápida anamnese: perguntaria os motivos da briga, o nome do filho, se ele tava mais pra Chet Baker ou pra Sylvester Stallone, levantaria recordações prazerosas da relação, pinçaria um ou dois versos do Drummond "ou do Raul, a depender do gosto do cliente" e, antes de tocarmos o solo, entregaria à mulher três parágrafos capazes de verter lágrimas até da estátua do Borba Gato.
[...]. (Antônio Prata. Trinta e poucos. São Paulo: Cia das Letras, 2016. p. 9 - 11.)

De acordo com o que estudamos, escolha a alternativa que traz uma característica essencial à crônica, presente no texto de Antônio Prata, que é a de apresentar:

A)
a informação objetiva de um fato.
B)
uma listagem de acontecimentos ordenados segundo a marcha do tempo, isto é, uma sequência cronológica.
C)
o escritor como um repórter que relata fatos do cotidiano.
D)
uma apreciação crítica, alternando entre a subjetividade literária e o relato de fatos.

E)
uma narração de fatos/acontecimentos (reais, como pretexto, ou ficcionais) sem qualquer juízo de valor.

Sagot :

Resposta:

D) uma apreciação crítica, alternando entre a subjetividade literária e o relato de fatos.

Explicação:

A crônica pode ser uma apreciação crítica, um juízo de valor, uma narração de fatos/acontecimentos (reais, como pretexto, ou ficcionais), alternando entre a subjetividade literária e o relato de fatos.

A resposta E) é uma pegadinha; uma crônica é também uma narração de fatos/acontecimentos (reais, como pretexto, ou ficcionais), mas, contrário à resposta, sim tem um juízo de valor.