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Um dia... Desculpe-me, não viso a efeitos de ficcionista, inflectindo de propósito, em agudo, as situações. Simplesmente lhe digo que me olhei num espelho e não me vi. Não vi nada. Só o campo, liso, às vácuas, aberto como o sol, água limpíssima, à dispersão da luz, tapadamente tudo. Eu não tinha formas, rosto? Apalpei-me, em muito. Mas, o invisto. O ficto. O sem evidência física. Eu era – o transparente contemplador?... Aturdi-me a ponto de me deixar cair numa poltrona.(...) E a terrível conclusão: não haveria em mim uma existência central, pessoal, autônoma? Seria eu um ... desalmado? (...) Pois foi que, mais tarde, anos, ao fim de uma ocasião de sofrimentos grandes, de novo me defrontei – não rosto a rosto. O espelho mostrou-me. Ouça. Por um certo tempo, nada enxerguei. Só então, só depois: o tênue começo de um quanto como uma luz, que se nublava, aos poucos tentando-se em débil cintilação, radiância. Que luzinha, aquela, que de mim se emitia, para deter-se acolá, refletida, surpresa? Se quiser, infira o senhor mesmo.(...) E... Sim, vi, a mim mesmo, de novo, meu rosto, um rosto; não este, que o senhor razoavelmente me atribui. Mas o ainda-nem-rosto – quase delineado apenas. Será que o senhor nunca compreenderá? Se sim, a “vida” consiste em experiência extrema e séria; sua técnica – ou pelo menos parte – exigindo o consciente alijamento, o despojamento, de tudo o que obstrui o crescer da alma, o que a atulha e soterra? Depois, o “salto mortale”... – ...E o julgamento-problema, podendo sobrevir com a simples pergunta: - “Você chegou a existir? (João Guimarães Rosa – “O espelho”)


TRANSCREVA do texto:
⦁ uma passagem em que é indicado que a vida é o produto final da
racionalidade e do espírito.

2-duas frases que constatem a fusão entre o homem e o narrador.

3- EXPLIQUE a função do termo “salto mortale” na penúltima frase do excerto

4- – JUSTIFIQUE o título do conto.


Sagot :

Resposta:

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Explicação:

Um dia... Desculpe-me, não viso a efeitos de ficcionista, inflectindo de propósito, em agudo, as situações. Simplesmente lhe digo que me olhei num espelho e não me vi. Não vi nada. Só o campo, liso, às vácuas, aberto como o sol, água limpíssima, à dispersão da luz, tapadamente tudo. Eu não tinha formas, rosto? Apalpei-me, em muito. Mas, o invisto. O ficto. O sem evidência física. Eu era – o transparente contemplador?... Aturdi-me a ponto de me deixar cair numa poltrona.(...) E a terrível conclusão: não haveria em mim uma existência central, pessoal, autônoma? Seria eu um ... desalmado? (...) Pois foi que, mais tarde, anos, ao fim de uma ocasião de sofrimentos grandes, de novo me defrontei – não rosto a rosto. O espelho mostrou-me. Ouça. Por um certo tempo, nada enxerguei. Só então, só depois: o tênue começo de um quanto como uma luz, que se nublava, aos poucos tentando-se em débil cintilação, radiância. Que luzinha, aquela, que de mim se emitia, para deter-se acolá, refletida, surpresa? Se quiser, infira o senhor mesmo.(...) E... Sim, vi, a mim mesmo, de novo, meu rosto, um rosto; não este, que o senhor razoavelmente me atribui. Mas o ainda-nem-rosto – quase delineado apenas. Será que o senhor nunca compreenderá? Se sim, a “vida” consiste em experiência extrema e séria; sua técnica – ou pelo menos parte – exigindo o consciente alijamento, o despojamento, de tudo o que obstrui o crescer da alma, o que a atulha e soterra? Depois, o “salto mortale”... – ...E o julgamento-problema, podendo sobrevir com a simples pergunta: - “Você chegou a existir? (João Guimarães Rosa – “O espelho”)

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