BARÃO — Sou o Barão Sigismundo de Kernoberg, seu vizinho, botânico de vocação, profissão e tradição, membro da Academia de Estocolmo, e comissionado pelo governo da Suécia para estudar a flora da América do Sul. V. Exa. dispensa a minha biografia? (d. Leonor faz um gesto afirmativo.) Direi somente que o tio de meu tio foi botânico, meu tio era botânico, eu botânico, e meu sobrinho há de ser botânico. Todos somos botânicos de tios a sobrinhos. Isto de algum modo explica minha vinda a esta casa.
D. LEONOR — Oh! o meu jardim é composto de plantas vulgares.
BARÃO, gracioso — É porque as melhores flores estão dentro de casa. Mas V. Exa. engana-se; não venho pedir nada do seu jardim.
D. LEONOR — Ah!
BARÃO — Venho pedir-lhe uma coisa que lhe há de parecer singular.
D. LEONOR — Fale.
[...]
BARÃO — Meu sobrinho Henrique anda estudando comigo os elementos da botânica. Tem talento, há de vir a ser um luminar da ciência. Se o casamos, está perdido.
D. LEONOR — Mas...
BARÃO, à parte — Não entendeu. (Alto.) Sou obrigado a ser mais franco. Henrique anda apaixonado por uma das suas sobrinhas, creio que esta que saiu daqui, há pouco. Impus-lhe que não voltasse a esta casa; ele resistiu-me. Só me resta um meio: é que V. Exa. lhe feche a porta.
D. LEONOR — Senhor barão!
BARÃO — Admira-se do pedido? Creio que não é polido nem conveniente. Mas é necessário, minha senhora, é indispensável. A ciência precisa de mais um obreiro: não o encadeiemos no matrimônio.
D. LEONOR — Não sei se devo sorrir do pedido.
BARÃO — Deve sorrir, sorrir e fechar-nos a porta. Terá os meus agradecimentos e as bençãos da posteridade.
D. LEONOR, sorrindo — Não é preciso tanto; posso fechá-la de graça.
BARÃO — Justo. O verdadeiro benefício é gratuito.
Esse texto é classificado como uma peça teatral, pois
A
há nele a presença de personagens e narrador.
B
seu enredo se desenvolve pelas falas das personagens e rubricas.
C
pode-se observar o uso de linguagem predominantemente figurativa.
D
aborda temas do cotidiano, como a convivência entre vizinhos e o casamento.