Texto 1
COMO COMECEI A ESCREVER
Carlos Drummond de Andrade
Aí por volta de 1910 não havia rádio nem televisão, e o cinema chegava ao interior do Brasil uma vez por
semana aos domingos. As notícias do mundo vinham pelo jornal, três dias depois de publicadas no Rio
de Janeiro. Se chovia a potes, a mala do correio aparecia ensopada, uns sete dias mais tarde. Não dava
para ler o papel transformado em mingau.
Papai era assinante da Gazeta de Notícias, e antes de aprender a ler eu me sentia fascinado pelas gra-
vuras coloridas do suplemento de Domingo. Tentava decifrar o mistério das letras em redor das figuras,
e mamãe me ajudava nisso. Quando fui para a escola pública, já tinha a noção vaga de um universo de
palavras que era preciso conquistar.
Durante o curso, minhas professoras costumavam passar exercícios de redação. Cada um de nós tinha
de escrever uma carta, narrar um passeio, coisas assim. Criei gosto por esse dever, que me permitia
aplicar para determinado fim o conhecimento que ia adquirindo do poder de expressão contido nos
sinais reunidos em palavras.
Daí por diante as experiências foram se acumulando, sem que eu percebesse que estava descobrindo
a leitura. Alguns elogios da professora me animavam a continuar. Ninguém falava em conto ou poesia,
mas a semente dessas coisas estava germinando. Meu irmão, estudante na Capital, mandava-me revis-
tas e livros, e me habituei a viver entre eles. Depois, já rapaz, tive sorte de conhecer outros rapazes que
também gostavam de ler e escrever.
Então começou uma fase muito boa de troca de experiências e impressões. Na mesa do café-sentado
(pois tomava-se café sentado nos bares, e podia-se conversar horas e horas sem incomodar nem ser
incomodado) eu tirava do bolso o que escrevera durante o dia, e meus colegas criticavam. Eles também
sacavam seus escritos, e eu tomava parte nos comentários. Tudo com naturalidade e franqueza. Aprendi
muito com os amigos, e tenho pena dos jovens de hoje que não desfrutam desse tipo de amizade crítica.
Texto 2
Maya Gabeira
A melhor surfista de ondas grandes do mundo viu a morte de perto e está pronta para outra
[...]
Acordamos no escuro e botamos os jets na água. Tsunami. Mar em fúria. Estava todo mundo transtor-
nado. Mas todo mundo bota no piloto automático. Você espera muitos anos por aquele momento. Então
é a hora da verdade, não tem que pensar muito, é agir. Não pode paralisar.
[...]
Eu estava no jet com o Scooby. E o Gordo estava com o Burle. O Burle já entrou acelerando, botou o Gordo
na corda... E capotou, perdeu o rádio de segurança, voltou correndo: “Ai, meu Deus, nunca vi isso. Tá
enorme, tá enorme”. Scooby olhou para mim e pulou na água. Falei: “Não, eu vou surfar primeiro”. Naquela
adrenalina toda, saltei para o jet do Burle. O mar estava especial, liso, gigantesco. Só quatro jets na água.
Vacilei. O Burle tentou me colocar numa onda, não larguei a corda. Tentou outra, não larguei. Ele falou:
“Decide: vai ou não vai?”. Falei: “Tô insegura. Tá grande demais”. A gente estava num negócio que era
outra dimensão. Aí fiquei quieta, ele me levantou, entrou uma onda muito maior do que as duas que eu
tinha perdido e, cara, depois da chamada do Burle...
Levantei confiante numa onda gigantesca. E Garret McNamara, que é o recordista mundial atualmente,
levantou junto comigo. Pensei: “Tudo bem, ele vai pegar esta e eu vou na próxima”. Foi quando ouvi o
Burle gritando: “Ele caiu, vai”. Eu estava bem posicionada, com velocidade boa, fui. [...]
1 - O que é relatado em cada texto?