O cronista, as borboletas e os urubus
Fui hoje pela manhã, em caminhada a pé, até o estádio do Flamengo, com o intuito de assistir ao treino do rubro-negro. A manhã era toda de uma festa de luz sobre as águas, os morros. Alguns barcos ainda se encontravam na lagoa, e os pássaros do arvoredo da ilha do Piraquê cantavam com alegria de primavera.
Tudo estava muito bonito, e o cronista descuidado e lírico começou a caminhada para gozar um pedaço desta maravilhosa cidade do Rio de Janeiro. E com esse propósito, de camisa aberta ao peito, procurou descobrir as borboletas azuis do seu caro Casimiro de Abreu.
Mas, em vez das lindíssimas borboletas, o cronista foi encontrando soturnos urubus, a passearem, a passo banzeiro, por cima do lixo, das imundices, dos animais mortos, de toda a podridão que a prefeitura vai deixando ali, por detrás dos muros do Jóquei Clube. Fedia tanto o caminho que o pobre cronista, homem de noventa quilos, teve de correr para fugir o mais depressa possível daquele cenário nauseabundo.
A manhã era linda, e o sol, apesar de tudo, brilhava sobre o lixo, indiferente a todo aquele relaxamento dos homens.
REGO, José Lins do. "Flamengo é puro amor". 111 crônicas escolhidas. 2. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2008.
Para dar vida ao cenário que está sendo descrito, o cronista se vale do recurso da personificação, como se pode comprovar no seguinte trecho:
A. “Alguns barcos ainda se encontravam na lagoa”.
B. “E com esse propósito, (...), procurou descobrir as borboletas azuis”.
C. “para gozar um pedaço desta maravilhosa cidade do Rio de Janeiro”.
D. “para fugir o mais depressa possível daquele cenário nauseabundo”.
E. “o sol, (...), brilhava sobre o lixo, indiferente a todo aquele relaxamento”