Como nasceram as estrelas
5
10
Pois é, todo mundo pensa que sempre houve no mundo estrelas pisca-pisca. Mas é erro. Antes os índios
olhavam de noite para o céu escuro — e bem escuro estava esse céu. Um negror. Vou contar a história
singela do nascimento das estrelas.
Era uma vez, no mês de janeiro, muitos índios. E ativos: caçavam, pescavam, guerreavam. Mas nas tabas
não faziam coisa alguma: deitavam-se nas redes e dormiam roncando. E a comida? Só as mulheres
cuidavam do preparo dela para terem todos o que comer.
Uma vez elas notaram que faltava milho no cesto para moer. Que fizeram as valentes mulheres? O
seguinte: sem medo enfurnaram-se nas matas, sob um gostoso sol amarelo. As árvores rebrilhavam verdes
e embaixo delas havia sombra e água fresca. Quando saíam de debaixo das copas encontravam o calor,
bebiam no reino das águas dos riachos buliçosos. Mas sempre procurando milho porque a fome era
daquelas que as faziam comer folhas de árvores. Mas só encontravam espigazinhas murchas e sem graça.
— Vamos voltar e trazer conosco uns curumins. (Assim chamavam os índios as crianças.) Curumim dá
sorte.
15
20
25
E deu mesmo. Os garotos pareciam adivinhar as coisas: foram retinho em frente e numa clareira da
floresta — eis um milharal viçoso crescendo alto. As índias maravilhadas disseram: toca a colher tanta
espiga. Mas os gatinhos também colheram muitas e fugiram das mães voltando à taba e pedindo à avó
que lhes fizesse um bolo de milho. A avó assim fez e os curumins se encheram de bolo que logo se
acabou. Só então tiveram medo das mães que reclamariam por eles comerem tanto. Podiam esconder
numa caverna a avó e o papagaio porque os dois contariam tudo. Mas — e se as mães dessem falta da
avó e do papagaio tagarela? Aí então chamaram os colibris para que amarrassem um cipó no topo do
céu. Quando as índias voltaram ficaram assustadas vendo os filhos subindo pelo ar. Resolveram, essas
mães nervosas, subir atrás dos meninos e cortar o cipó embaixo deles.
Aconteceu uma coisa que só acontece quando a gente acredita: as mães caíram no chão,
transformando-se em onças. Quanto aos curumins, como já não podiam voltar para a terra, ficaram no
céu até hoje, transformados em gordas estrelas brilhantes. Mas, quanto a mim, tenho a lhes dizer que
as estrelas são mais do que curumins. Estrelas são os olhos de Deus vigiando para que corra tudo bem.
Para sempre. E, como se sabe, “sempre” não acaba nunca.
Por que os curumins ficaram com medo das mães? Você acha que isso foi motivo suficiente? O que teria
feito no lugar deles? _