Cadê os plural?
É só impressão minha, ou está cada vez mais difícil ouvir plurais ortodoxos? Aqueles de
antigamente, arrematados com um ''s'' - plurais tradicionais, quatrocentões? Os plurais
agora estão cada vez mais enrustidos, dissimulados, problemáticos. Cada vez menos
plurais são assumidos. Os plurais agora precisam ser subentendidos.
Verdade seja dita: não somos os únicos no mundo a ter problemas com a maldita letra ''s''
no final das palavras. Os franceses, debaixo de toda aquela empáfia, há séculos desistiram
de pronunciar o ''s'' dos plurais. No francês oral, o plural é indicado pelo artigo, e pronto. Ou
seja: eles falam ''as mina'' e ''os mano'' desde que foram promovidos de gauleses a
guardiães da cultura e da civilização.
Os italianos também não podem com a letra ''s'' no fim das palavras. Fazem seus plurais em
''i'' e em ''e'', dependendo do sexo, ops, do gênero das palavras. Quando a palavra é
estrangeira, entretanto, eles simplesmente desistem de falar no plural: decretaram que
termos forasteiros são invariáveis, e tudo bem. Una foto, due foto; una caipirinha, quattro
caipirinha. Quattro caipirinha? Hic! Zuzo bem!
Os alemães, metódicos que só, reservam o ''s'' justamente a esses vocábulos estrangeiros
que os italianos permitem que andem por aí sem plural. Com as palavras do seu próprio
idioma, no entanto, os alemães são implacáveis. As palavras mais sortudas ganham apenas
um ''e'' no final, mas as outras são flexionadas com requintes de tortura - com ''n'' (!) ou com
''r'' (!!), às vezes em conjunto com um trema (!!!) numa vogal da penúltima sílaba (!!!!), só
para infernizar a vida dos alunos do Instituto Goethe ao redor do planeta.
Práticos são os indonésios, que formam o plural simplesmente duplicando o singular:
gado-gado, padang-padang, ylang-ylang. Pelo menos foi isso que eu li uma vez. (Claro que
não chequei a informação. Eu detestaria descobrir que isso não é verdade.) Já pensou se a
moda pega aqui, feito aquele pavoroso cigarro de cravo? Os mano-mano. As mina-mina.
Um chopps e dois pastel-pastel.
Nem mesmo nossos primos de fala espanhola escapam da síndrome dos comedores de
plural. Os andaluzes e praticamente todos os latino-americanos também não são muito
chegados a um ''s'' final. Em vez do ''s'' ríspido e perigosamente carregado de saliva dos
madrilenhos (que chiam quase tanto quanto os portugueses), eles transformaram o plural
num acontecimento sutil, perceptível apenas por ouvidos treinados. Em Sevilha, Buenos
Aires ou em Santo Domingo, o ''s'' vira um ''h'' aspirado – lah cosah, lah personah, loh
pluraleh.
Entre nós, contudo, a mutilação do plural não tem nada a ver com sotaques ou
incapacidade de pronunciar fonemas. Aqui em São Paulo, a falta de ''s'' é um fenômeno
sociocultural. Os pobres não falam no plural por falta de cultura. Da classe média para cima,
deixamos o plural de lado quando há excesso de intimidade. É como se o plural fosse algo opcional, como escolher entre ''você'' e ''o senhor''. Se a situação exige, você vai lá e aperta
a tecla PLURAL. Se a conversa for entre amigos, basta desligar, e os esses desaparecem
em algum ponto entre o cérebro e a boca.
O que se deve fazer? Uma grande campanha educativa, com celebridades declarando que
é chique falar os plurais? Lançar pagodes e canções sertanejas falando da dor-de-cotovelo
causada por não usar ''s'' no final das palavras? Ou contratar um grupo de artistas
alternativos para sair pichando nos muros por aí uma mensagem subversiva? Tipo assim:
OS MANOS E AS MINAS.
ATIVIDADE SOBRE O TEXTO "Cadê os plural?" 1- O que você observa de relação entre o título do texto e o texto em si? 2- O texto é uma crítica a quem não usa o plural? Por quê? 3- Observe no seu dia a dia as pessoas falando ao seu redor e veja se elas usam o plural "corretamente"? Por quê isso acontece? 4- É errado falar sem usar o plural? Explique. 5- O que o texto tem algo a ver sobre adequação de linguagem? Por quê?
Me Ajudar Aí Por Favor