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O ASSALTO
Carlos Drummond de Andrade
Na feira, a gorda senhora protestou a altos brados contra o preço do chuchu:
• Isto é um assalto!
Houve um rebuliço. Os que estavam perto fugiram. Alguém, correndo, foi chamar
o guarda. Um minuto depois, a rua inteira, atravancada, mas provida de um admirável
serviço de comunicação espontânea, sabia que se estava perpetrando um assalto ao
banco. Mas que banco? Havia banco naquela rua? Evidente que sim, pois do
contrário como poderia ser assaltado?
• Um assalto! Um assalto!
• A senhora continuava a exclamar, e quem não tinha escutado, escutou,
multiplicando a notícia. Aquela voz subindo do mar de barracas e legumes era como a
própria sirena policial, documentando, por seu uivo, a ocorrência grave, que
fatalmente se estaria consumando ali, na claridade do dia, sem que ninguém pudesse
evitá-la.
Moleques de carrinho corriam em todas as direções, atropelando-se uns aos outros.
Queriam salvar as mercadorias que transportavam. Não era o instinto de propriedade
que os impelia. Sentiam- se responsáveis pelo transporte. E no atropelo da fuga,
pacotes rasgavam-se, melancias rolavam, tomates esborrachavam-se no asfalto.
Se a fruta cai no chão, já não é de ninguém; é de qualquer um, inclusive do
transportador. Em ocasiões de assalto, quem é que vai reclamar uma penca de
bananas meio amassadas?

• Olha o assalto! Tem um assalto ali adiante!
O ônibus na rua transversal parou para assuntar. Passageiros ergueram-se, puseram
o nariz para fora. Não se via nada. O motorista desceu, desceu o trocador, um
passageiro advertiu:
• No que você vai a fim do assalto, eles assaltam sua caixa.
Ele nem escutou. Então os passageiros também acharam de bom alvitre abandonar
o veículo, na ânsia de saber, que vem movendo o homem, desde a idade da pedra até a
idade do módulo lunar. Outros ônibus pararam, a rua entupiu.
• Melhor. Todas as ruas estão bloqueadas. Assim eles não podem dar no pé.
• É uma mulher que chefia o bando!
• Já sei. A tal dondoca loira.
• A loura assalta em São Paulo. Aqui é morena.
• Uma gorda. Está de metralhadora. Eu vi.
• Minha Nossa Senhora, o mundo está virado!
• Vai ver que está caçando é marido.
• Não brinca numa hora dessas. Olha aí sangue escorrendo!
• Sangue nada, é tomate.
Na confusão, circularam notícias diversas.
O assalto fora a uma joalheria, as vitrinas tinham sido esmigalhadas a bala. E havia
joias pelo chão, braceletes, relógios. O que os bandidos não levaram, na pressa, era
agora objeto de saque popular. Morreram no mínimo duas pessoas, e três estavam
gravemente feridas.
Barracas derrubadas assinalavam o ímpeto da convulsão coletiva. Era preciso abrir
caminho a todo custo. No rumo do assalto, para ver, e no rumo contrário, para
escapar.
Os grupos divergentes chocavam-se, e às vezes trocavam de direção; quem fugia
dava marcha à ré, quem queria espiar era arrastado pela massa oposta. Os edifícios de
apartamentos tinham fechado suas portas, logo que o primeiro foi invadido por pessoas
que pretendiam, ao mesmo tempo, salvar o pelo e contemplar lá de cima. Janelas e
balcões apinhados de moradores, que gritavam:
• Pega! Pega! Correu pra lá!
• Olha ela ali!
• É um mascarado! Não, são dois mascarados!
Ouviu-se nitidamente o pipocar de uma metralhadora, a pequena distância. Foi um
deitar no chão geral, e como não havia espaço uns caíam por cima de outros.
Cessou o ruído, Voltou. Que assalto era esse, dilatado no tempo, repetido, confuso?
• Olha, um menino tocando matraca! E a gente com dor-de-barriga, pensando
que era metralhadora!
Caíram em cima do garoto, que sorveteu na multidão. A senhora gorda apareceu,
muito vermelha, protestando sempre:

• É um assalto! Chuchu por aquele preço é um verdadeiro assalto!

7)De acordo com o texto, é INCORRETO afirmar que:
a) ( ) o alto preço dos gêneros alimentícios, como o chuchu e o tomate, é comparável a
um roubo sofrido pelos feirantes.
b) ( ) os chamados “boatos” têm sempre algum fundamento, corroborando a expressão
popular: “o povo aumenta, mas não inventa”.
c) ( ) o assalto, em local de intenso movimento de pessoas, gera danos apenas pela
convulsão coletiva e não pelo bem subtraído.
d) ( ) a comunicação espontânea entre as pessoas transmite informações nem sempre bem
fundamentadas.
8)De acordo com o texto, das notícias que circularam, a única verdadeira é:
a)( ) Um menino tocava matraca.
b)( ) Tem um assalto ali adiante!
c)( ) Era uma mulher que chefiava o bando.
d)( ) Morreram no mínimo duas pessoas.

Sagot :

Resposta: 7 letra C

8 letra A

Espero ter ajudado!

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