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Sagot :
Resposta:
A questão nacional pode estar na base de algumas lutas e controvérsias fundamentais dos países da América Latina. Em diferentes épocas, principalmente em conjunturas críticas mais profundas, reabre-se a problemática nacional. Alguns dos principais temas da história e pensamento latino-americanos põem em causa as origens, transformações, crises e dilemas da sociedade nacional, do Estado-Nação.
A Nação pode ser vista como uma configuração histórica, em que se organizam, sintetizam e desenvolvem forças sociais, atividades econômicas, arranjos políticos, produções culturais, diversidades regionais, multiplicidades raciais. Tanto o hino, a bandeira, o idioma, os heróis e os santos, como a moeda, o mercado, o território e a população adquirem sentido no contexto das relações e forças que configuram a Nação. A Nação pode ser uma formação social em movimento; pode desenvolver-se, transformar-se, romper-se.
Na América Latina, as guerras e revoluções de independência estão na origem da Nação, estabelecendo alguns dos seus traços principais. As revoluções burguesas são momentos fundamentais do modo pelo qual essa Nação reorganiza aqueles traços e elabora novos As revoluções populares são outras conjunturas da maior importância, quando se trata de conhecer os traços e movimentos da sociedade nacional. Tanto assim que a Nação burguesa pouco tem a ver com a socialista, que emerge da revolução popular; e abre outra história.
A problemática nacional revela-se de forma particularmente aberta quando se colocam alguns dos temas clássicos do pensamento latino-americano. Esses temas sempre implicam em aspectos mais ou menos fundamentais das forças e relações sociais que organizam, desenvolvem, transformam, ou rompem a sociedade nacional, o Estado-Nação.
Os desencontros entre a sociedade e o Estado são um desafio permanente nos países da América Latina, no continente e nas ilhas. Os partidos políticos e os movimentos sociais preocupam-se seriamente com eles. Todos que se dedicam a pensar a democracia e a ditadura são obrigados a examinar esse desafio. A atividade política de grupos e classes sociais, na cidade e no campo, defronta-se com ele Esse é um desafio prático e teórico fundamental para todos.
Muitos dizem que a sociedade civil é débil, pouco organizada. Falam em instabilidade política congênita. Afirmam que as dualidades estruturais são antigas e insuperáveis: arcaico-moderno, patrimonial-racional, indo-americano, afro-americano, costa-serra, litoral-sertão, ibérico-europeu, barbárie-civilização, caliban-ariel. São dualidades que empurram para a frente e arrastam para trás; fazem o caminho tortuoso, labiríntico, mágico. O círculo vicioso da causação circular cumulativa seria a chave de uma história de miséria, violência, autoritarismo, tirania. Na América Latina, a história estaria atravessada pelo precário, provisório, inacabado, mestiço, exótico, deslocado, fora do lugar, folclórico. Nações sem povo, nem cidadãos; apenas indivíduos e população.
Por isso, dizem, o Estado é forte, a democracia episódica, a ditadura recorrente. São as elites deliberantes militares, civis, oligárquicas, empresariais, tecnocráticas que sabem e podem. Chega-se a afirmar que um poder estatal esclarecido, apoiado na sabedoria da ciência, ou iluminado pela vontade política, poderá educar a sociedade, dinamizar a economia, conferir responsabilidade aos partidos, criar a opinião pública, lançar o país no leito da legalidade, legitimidade, democracia. O autoritarismo congênito e recorrente seria uma contingência da transição do caos à ordem, dos séculos de patrimonialismo escravista à república democrática, do poder oligárquico ao racional, do absolutismo ibérico à liberal-democracia. Assim, a sociedade civil seria retirada da sua debilidade essencial; do vício para a virtude.
São muitas as lutas e controvérsias que implicam na problemática compreendida pela questão nacional.
A questão nacional se coloca desde o início da história, no primeiro momento, como dilema prático e teórico. As guerras e revoluções de independência sintetizam-se precisamente nesse dilema. O que há de épico nas lutas simbolizadas por Tausaint Louverture, Francisco de Miranda, Simón Bolívar, José Artigas, José Morelos, Miguel Hidalgo, Bartolomé Mitre, Bernardo O'Higgins, Antonio Sucre, José Bonifácio, Frei Caneca, Ramón Betances, José Martí e muitos outros, está enraizado na façanha destinada a emancipar a colônia, criar o Estado, organizar a Nação. Retirá-la do colonialismo, absolutismo, mercantilismo, acumulação originária, conferindo-lhe um nome. A criação do Estado, segundo os princípios adotados na constituição, em conformidade com as forças sociais, as peculiaridades da economia, as diversidades regionais, raciais e culturais, tudo isso representa o empenho de descobrir o perfil da Nação.
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