VALE TUDO PELA SUA ATENÇÃO NAS REDES SOCIAIS?
10/06/2020
Texto de Denis Pacheco, com reportagem de Gabriel Guerra e Matheus Souza
Quando chegou ao Brasil, a Internet surgiu como uma espécie de “terra de ninguém”. Apesar do sentido aparentemente depreciativo da expressão, a então chamada “rede mundial de computadores” era um território descentralizado e não dominado por buscadores de conteúdo. Sites possuíam endereços virtuais difíceis de se memorizar, e as primeiras formas de se comunicar em tempo real envolviam a criação de personas virtuais, incluindo aí nicknames que mascaravam as identidades reais dos usuários. Quase 30 anos depois, o cenário atual não poderia ser mais diferente. O que era anárquico se tornou por demais regrado, o que pode ser positivo, por exemplo, quando se discute mais ativamente a importância da privacidade e proteção de dados na rede, ou insuficiente em função do avanço indiscriminado das notícias falsas (as fake news, em inglês), que explora brechas nos termos de responsabilidade elaborados pelas grandes plataformas privadas.
Com a introdução de redes sociais como o Facebook, que atualmente tem uma base de 127 milhões de usuários mensais no Brasil, a utilização de nomes reais associados a fotos de perfil mudou para sempre a forma como nos apresentamos e nos comportamos na Internet. E a partir dessa mudança, começaram a surgir figuras que hoje disputam nossa atenção e rivalizam até mesmo com o poder das grandes emissoras. Os chamados influenciadores (ou influencers, em inglês) se tornaram as figuras mais proeminentes das redes sociais e das plataformas de conteúdo, como o YouTube. Se redes como o Twitter, Facebook e Instagram fossem nações, os influenciadores seriam seus mais notáveis embaixadores. [...].
“A gente considera influenciador, no discurso ‘comum’, como uma pessoa que tem um grande número de seguidores e influencia pessoas”, explica Pablo Ortellado, professor do curso de Gestão de Políticas Públicas da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP e coordenador do Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação (Gpopai).
Para ele, a teoria por trás dos influenciadores começou lá atrás, com a ideia, ainda na época dos meios de comunicação de massa, de que as pessoas não se informavam diretamente com a fonte primária, mas em sistema de duas escalas. “Uma pessoa tinha muita influência em uma determinada comunidade, se informava, formava uma opinião e distribuía entre as pessoas sobre quem ela tinha ascendência”, esclarece. Armados com diferentes tipos de retórica, os influenciadores se distinguem não apenas pela plataforma ou canal no qual se fazem mais presentes, mas também pelos diferentes usos de linguagem que utilizam para atingir seus públicos. “Tem influenciador que tem linguagens muito simples, que simplesmente se apoia no seu carisma. Outros são influenciadores que se estabelecem porque eles têm algum conhecimento técnico, como esses da área de ciências. Não tem uma regra geral”, classifica Ortellado.
Para Elizabeth Nicolau Saad Corrêa, professora da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP e pesquisadora nas áreas de comunicação e jornalismo digital, existem dois tipos de influenciadores em ação nas redes. “De um lado a gente tem o ‘influencer efetivo’, que é aquela pessoa que tem um conjunto de competências e habilidades num determinado tema e que por conta desse conjunto ela ganha legitimidade para falar sobre ele”, explica ela. Na sequência, de acordo com a professora, o segundo tipo de influenciador é um fenômeno característico que nasce nas brechas das redes sociais. “São aqueles que são alavancados por meio de quantidade de likes e de ampliação de seguidores, algumas vezes por meio de compra de seguidores”, pontua ao deixar claro que, para enquadrar pessoas nessa categoria, é necessária uma análise cuidadosa.
Fonte: PACHECO, D.; GUERRA, G. e SOUZA, M. Vale tudo pela sua atenção nas redes sociais? Jornal da USP, 2020. Texto adaptado.
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